TUDA - pap.el el.etrônico

Em associação com Casa Pyndahýba Editora

Ano I Número 10 - Outubro 2009

Crônica - José Miranda Filho


O Conquistador

Ele tentou, mas não conseguiu. Estava difícil naquela manhã cinzenta e úmida completar sua caminhada que fazia diariamente há vinte e dois anos por recomendação médica. A chuva fina e insistente obstou seu desejo. Desistiu da caminhada. Voltou para casa desolado. Tirou o agasalho, vestiu novamente o pijama e deitou-se na cama para aproveitar os poucos momentos que ainda dispunha antes de reiniciar suas atividades diárias. Ao seu lado a mulher dormia um sono profundo, que nem o viu chegar. O teto do quarto e a luz da rua que se infiltrava pela janela, eram os únicos pontos em que ele fixava os olhos, aguardando o momento de se levantar novamente. O pensamento andou ocioso procurando lembranças do passado. Recordou-se dos amigos, das farras que faziam, das namoradas que foram tantas...

Era um sedutor que gostava de importunar mulheres casadas. Usava brilhantina “glostora” nos cabelos, que quando exposta ao sol escorria-lhe pelo rosto bronzeado. Era um verdadeiro galã, alto, forte e esbelto. Aliás, seu desejo na juventude sempre fora ser artista de cinema. Não conseguiu ir adiante por querer comer todas as atrizes com quem contracenava. Tentou a carreira política. Nesta teve mais sucesso quando conseguiu eleger-se vereador de sua pequena cidade. Sua esposa aceitava tudo passivamente, em nome da família, da manutenção do casamento e do prestigio pessoal que desfrutavam na sociedade local.

Ele adorava o nome que sua mãe o havia dado em homenagem ao padrinho, gerente da fabrica inglesa de materiais bélicos que se instalara na cidade durante a segunda guerra mundial: Serney!

De repente, alguém lá fora gritou o seu nome: - Serney...Serney.... Vem aqui fora!

Levantou-se curioso, abriu a janela para ver quem o chamava, pois tivera a sensação de ter reconhecido a voz. Um forte estampido de arma de fogo fez sua mulher acordar, desesperada por não vê-lo ao seu lado, junto à janela o corpo ensangüentado de Serney. Um tiro na testa disparado por um marido traído que já o perseguia algum tempo, consumou a tragédia...